Organizações e Movimentos Sociais cobram Consulta Pública sobre projeto que pretende alterar as regras de funcionamento do Judiciário

ricardo

As organizações de direitos humanos e movimentos sociais que se reúnem na Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDh) encaminharam nesta quarta-feira (8), ao Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowski, um pedido de abertura de consulta pública para discussão com a sociedade sobre as mudanças na Lei Orgânica da Magistratura (LOMAN).

A preocupação com os atuais rumos do anteprojeto da LOMAN e o temor que o projeto seja enviado ao Congresso Nacional sem a realização de um debate com a sociedade, originou o ofício enviado a Lewandowski. A Lei Orgânica da Magistratura dispõe sobre estrutura, a composição, a organização e o funcionamento dos órgãos do Poder Judiciário e institui o Regime Jurídico da Magistratura Nacional, o que traz impactos diretos e indiretos tanto no orçamento do País quanto na concretização de nossa democracia.

As organizações acompanharam com apreensão as notícias divulgadas na imprensa – avaliações de ministros, conselheiros e professores indicam que alguns dispositivos contidos no anteprojeto podem enfraquecer o papel do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Exemplo disso é a restrição da investigação de denúncias contra magistrados feitas pelo conselho, independentemente da corregedoria local – vale lembrar que essa questão já foi resolvida pelo STF. A proibição aos conselheiros não magistrados de interrogatório e julgamento de juízes em processos disciplinares também aponta para um possível enfraquecimento do CNJ.

As organizações que compõe a JusDh acreditam que o caminho deva ser o oposto do desenhado no anteprojeto. “É preciso enfrentar a resistência do Judiciário em institucionalizar espaços de controle social”, avalia Luciana Pivato, assessora jurídica da organização de defesa de direitos humanos Terra de Direitos, e integrante da JusDh.

“O CNJ, que já enfrenta problemas decorrentes da falta de estrutura para atender o enorme volume de processos relacionados à investigação de juízes e da pouca participação da sociedade civil em sua composição”, aponta. Segundo ela, apenas dois dos quinze conselheiros são representantes da sociedade. Das demais vagas, nove pertencem a própria magistratura, duas ao Ministério Público e duas à advocacia. “É preciso avançar e se constituir como um lugar para discussão da política pública de justiça, e não retroceder”, afirma.

>> Nos processos de escolhas desses dois conselheiros não existe qualquer participação popular – cabe à Câmara dos Deputados e ao Senado promover a indicação para as vagas da sociedade civil no conselho. Mais sobre o CNJ que queremos na análise produzida por Erika Lula de Medeiros na 5ª edição do caderno Direitos Humanos, Justiça e Participação Social.  

Para a JusDh, o CNJ possui um importante papel de espelho institucional para iniciativas de democratização, planejamento estratégico e execução da política pública de justiça para todo o Poder Judiciário. Nos últimos anos, foram observadas iniciativas orientadas para uma maior interlocução entre o Poder Judiciário, a sociedade civil organizada e especialistas em temas de direitos humanos, como o Fórum de Assuntos Fundiários e o Fórum de Saúde. Essas e novas iniciativas devem ser incentivadas e priorizadas pelo CNJ, garantindo a efetiva participação social.

No documento enviado ao Ministro Lewandowski, as organizações consideram que ,na medida em que aumenta a presença e influência do Poder Judiciário na sociedade, amplia-se também a responsabilidade social desse Poder.

“Faz-se necessário uma lei que garanta a alteração das estruturas hierárquicas do Poder Judiciário, bem como que sejam instituídos instrumentos de diálogo com a sociedade sobre temas de interesse público e natureza coletiva. Isto é fundamental para garantir que a resposta jurisdicional corresponda aos anseios sociais, e desse modo seja potencializada em termos de eficácia e legitimidade”, aponta o documento, reforçando a importância do debate com a sociedade e do compromisso social.

Leia o ofício completo.

A LOMAN

A revisão da LOMAN, Lei Complementar 35 de 1979, é uma grande oportunidade para que a sociedade discuta sobre vários problemas do Judiciário brasileiro. Sem um amplo debate, avanços necessários à maior democratização da justiça, tais como a implementação das Ouvidorias Externas no sistema de justiça, podem ficar de fora da proposta de reforma, que deve ser encaminhada em breve ao Congresso Nacional.

>> Consulte também a análise elaborada por Ester Rizzi, pela Ação Educativa, na 4ª edição do caderno Direitos Humanos, Justiça e Participação Social.

Desde 2010, a importância de a sociedade conhecer e discutir o tema da LOMAN vem sendo pautada pela JusDh. Em vigor desde os tempos da ditadura militar, a Lei prevê uma estrutura de poder verticalizada e não adequada à democracia, com uma cultura de negação aos direitos humanos e ao controle social na elaboração e fiscalização da gestão da justiça.

>> Mais sobre a Loman no artigo ‘Quem orienta a Reforma do Judiciário no Congresso Nacional?’, produzido pela Terra de Direitos na 2ª edição do caderno Direitos Humanos, Justiça e Participação Social.                           

Temas como a aposentadoria compulsória como pena para magistrados, vitaliciedade para cargos de Ministros de Tribunais Superiores e os polêmicos privilégios da magistratura são regidos por esta lei que, por isso, não pode ser decidida sem um processo que garanta uma ampla discussão com a sociedade brasileira.

Em artigo publicado pela JusDh o juíz de Direito, Marcelo Semer, levanta outros temas de extrema importância para o debate sobre a reforma da LOMAN. Entre eles, a liberdade de expressão dos juízes, já que a legislação atual proíbe os magistrados de emitirem opiniões sobre outras decisões ou processos em andamento e, a independência dos juízes, que é afrontada pela lógica hierárquica e pelo poder de remoção e designação atribuída aos presidentes dos Tribunais.

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