A JusDh divulgou nesta quinta-feira (2) carta aberta que compila uma série de problemáticas em relação a escolha e nomeação do/a novo/a Ministro/a do Supremo Tribunal Federal (STF) e expressa a preocupação das entidades da Articulação com falta de transparência e diálogo com a sociedade.
Enviado à Michel Temer e Alexandre Moraes, o documento requer a regulamentação do processo de nomeação de Ministros/as, com procedimentos que garantam a chamada pública de candidaturas, aliada a etapas de divulgação das candidaturas, consulta pública quanto aos perfis dos candidatos e participação da sociedade nas sabatinas.
Ainda, a carta exige que o compromisso com os direitos humanos, as perspectivas de gênero e raça sejam critérios estruturantes para escolha de novos membros do STF.
Apoiado por todas as entidades que compõem a Articulação Justiça e Direitos Humanos, o documento está aberto a adesão de organizações, entidades e movimentos sociais. Apoie!
>> Leia a carta na íntegra:
Por transparência e participação social nos processos de nomeações de Ministros/as do Supremo Tribunal Federal
Aos Senhores
Presidente da República Michel Temer
Ministro da Justiça Alexandre de Moraes
A Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDh), rede da sociedade civil criada em 2011, que reúne organizações de direitos humanos, movimentos sociais e ativistas que lutam pela democratização da Justiça brasileira, novamente preocupada com a falta de transparência, diálogo com a sociedade e critérios para escolha e nomeação do/a novo/a Ministro/a do Supremo Tribunal Federal (STF), vem expor e requerer o que segue:
A postura histórica de isolamento e condução a portas fechadas da política de justiça não condiz com a construção do Estado Democrático de Direito, em todas as suas esferas e poderes. E, como instituição da administração pública brasileira, o Judiciário também deve fazer parte das respostas aos anseios dos brasileiros e brasileiras.
Construir mecanismos para participação da sociedade nos processos de indicação de pessoas que ocuparão a relevante função de Ministros/as da mais alta Corte do país, certamente significa um passo fundamental para tornar o sistema de justiça mais plural e para responder às demandas sociais por direitos e democracia.
A sociedade brasileira vem descobrindo a importância dos órgãos do sistema de justiça nos processos de decisão sobre os rumos do país e tem lutado para que a agenda política de justiça não se dê à margem de qualquer diálogo e mecanismo de controle social.
Inconformada com o modelo retrógrado dos processos de nomeação para o STF, que alija a população dos seus direitos à informação idônea e à participação popular, a JusDh, desde sua criação, reivindica mudanças nos processos de indicação e sabatina, com a definição de regulamento que garanta mecanismos democráticos, participação da sociedade, controle social e a definição de critérios para escolha de novos Ministros/as.
É oportuno frisar que a necessidade de ampliação democrática no procedimento de indicação de Ministros/as do STF tem sido uma reivindicação de setores da própria magistratura comprometidos com o aprofundamento democrático no judiciário. Em 2010 e 2011, a Associação Juízes para a Democracia (AJD), por exemplo, encaminhou à Presidência da República pedido para edição de “decreto que estabelecesse procedimento apto a permitir e a estimular a participação popular no processo de escolha dos integrantes do STF”. A Associação também tem lançado documentos e notas públicas e apontado caminhos para a regulamentação do procedimento.
Também para a JusDh, o procedimento de escolha de novos/as Ministros/as deveria ao menos incluir etapas como: 1) Chamada pública de candidaturas; 2) Disponibilização no portal eletrônico da Presidência da República dos nomes e antecedentes curriculares das candidaturas que se encontrem em consideração pela Presidência; 3) Abertura de prazo para consulta pública a respeito dos pré-candidatos, e publicização das informações; 4) Elaboração e publicação de relatório final que justifique a escolha do candidato ou candidata que será submetido à sabatina do Senado.
O “Manifesto de lançamento de anticandidatura ao Supremo Tribunal Federal” já conta com mais de 4.000 assinaturas de apoio e demonstra claramente não só o desejo da sociedade ser ouvida sobre as novas escolhas para o STF, mas torna público o repúdio de mulheres, LGBTs, profissionais de diversas áreas e de diferentes segmentos da sociedade sobre os rumores da possível indicação do jurista Ives Gandra Martins Filho, conservador, com posições sexistas e homofóbicas, para ocupar o lugar do Ministro Teori Zavascki.
Acreditamos que o compromisso com os direitos humanos, a perspectiva de gênero e raça devem ser elevados a critério fundamental para a escolha da Presidência, aliado à instituição da transparência e participação popular como procedimentos democráticos de todas as indicações para os Tribunais Superiores.
Preocupadas em conhecer a compreensão, as posturas e o compromisso das/os juristas indicados/as em relação aos direitos humanos e à democratização do Sistema de Justiça, as organizações que se reúnem na JusDh também têm apresentado questões para serem consideradas e formuladas pelos Senadores por ocasião das sabatinas dos/as candidatos/as ao Supremo, uma vez que, também nesta etapa, mesmo com as mudanças recentes no regimento interno do Senado, as formas de participação da sociedade permanecem insuficientes.
Criar ou alterar as regras que determinam a composição da mais alta Corte de Justiça do país não é tarefa fácil e não pode se dar sem um amplo debate público, tampouco se orientar por casuísmos políticos, como os que determinam o andamento ou a paralisação da agenda legislativa que trata desse tema no Congresso Nacional com as chamadas “PECs do STF”. É preocupante que a comissão especial criada na Câmara dos Deputados Federais tenha se ocupado com produzir relatório sobre as PECs em tramitação sem ouvir amplamente a sociedade, nem mesmo a comunidade jurídica e acadêmica que tanto podem contribuir para esse debate.
O processo de reforma do Judiciário ainda está em curso e deve se realizar de modo a aprofundar o seu alcance no sentido da democratização da justiça.
Por todos esses motivos, as organizações que abaixo subscrevem vêm requerer que o processo de nomeação de Ministros/as do Supremo Tribunal Federal seja regulamentado, com procedimentos que garantam a chamada pública de candidaturas, aliada a etapas de divulgação das candidaturas, consulta pública quanto aos perfis dos candidatos e participação da sociedade nas sabatinas. Requeremos ainda que o compromisso com os direitos humanos, as perspectivas de gênero e raça sejam critérios estruturantes para escolha de novos/as Ministros/as.
Os mecanismos sobre nomeações para Ministros da alta cúpula do Judiciário não podem ser resolvidos à margem da sociedade. Para a JusDh, esses procedimentos, assim como outros temas relacionados à administração da justiça, devem ser trazidos para uma ampla e transparente discussão com a sociedade, pois são temas de interesse público, com impactos para o avanço ou não da democracia brasileira.
Brasília, fevereiro de 2017
Articulação Justiça e Direitos Humanos (JusDh)