Presidente Jair Bolsonaro indica nome fora da Lista Tríplice. Para JusDh quebra na tradição torna o processo menos transparente e suscetível a interferências
Por: Assessoria de Comunicação JusDh
Com o fim do mandato da atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge, os holofotes se voltam para o novo indicado do presidente Jair Bolsonaro. Você sabe por que a indicação é tão importante para o atual modelo de Justiça que temos? A JusDh vai te explicar qual o papel da Procuradoria Geral da República (PGR), e por que o cargo de PGR tem tantos impactos sobre o Sistema de Justiça.
Em primeiro lugar, a PGR exerce a chefia do Ministério Público da União (MPU) – ver quadro abaixo.
Além disso, também comanda especificamente o Ministério Público Federal (MPF). Seus membros são chamados(as) de procuradores da República e têm a função de opinar, através de pareceres, sempre visando à legalidade dos processos. Mas também devem entrar com ações judiciais, como ações penais, ações civis públicas e ações de improbidade administrativa.
Nessa posição, o(a) Procurador(a)-Geral da República é o(a) principal líder e representante da instituição perante a sociedade brasileira e as demais instituições.
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Mas o que a PGR faz no Ministério Público?
Por ser a representação do Ministério Público (MP) na esfera federal, ela exerce as funções de MP no Supremo Tribunal Federal (STF), no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e também no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sendo essas as mais altas instâncias do Poder Judiciário. O procurador-geral da República é quem designa os subprocuradores-gerais da República para atuarem nas turmas do STF, no STJ e no TSE.
Por exemplo no STF, o (a) representante da PGR é legitimado(a) a propor ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) – que visam questionar a validade de projetos e ações feitas pelo Executivo e o Legislativo, representação para intervenção federal nos estados e no Distrito Federal, além de propor ações penais públicas e cíveis. No STJ, o (a) PGR pode propor representação pela federalização de casos de crimes contra os direitos humanos e ações penais.
Percebeu a importância do órgão?
E como a população participa desse processo?
De forma objetiva, a população não participa muito da escolha desse representante. Um passo inicial poderia ser feito com base nas propostas elencadas pela JusDH na pesquisa “Porteiro ou Guardião? O Supremo Tribunal Federal na agenda política das organizações de direitos humanos”. A pesquisa em especial reivindica a democratização do processo de escolha das ministras/os do STF, fundamentadas na participação social e no compromisso com os direitos humanos.
A publicação aponta como necessário a criação de um processo de limitação e regulamentação da indicação presidencial, instituindo transparência, chamada e delimitação pública de candidaturas, complementada com consulta pública virtual ou via audiência e sabatina, em uma agenda que também se estende alternativamente ao Senado Federal.
Neste processo de regulamentação da indicação presidencial há que se incorporar também o reconhecimento e equidade de gênero e raça, bem como apreciação concreta do currículo e memorial profissional em relação ao compromisso com os direitos humanos, além de incorporar, desde uma perspectiva afirmativa ainda, a diversidade étnico-racial e regional.
Você deve estar se perguntando: como se escolhe alguém para esse cargo tão importante? Veja a explicação abaixo e entenda como acontece o processo de indicação do nome para ocupar o cargo de Procurador-Geral da República:
Todo esse processo de indicação até a nomeação é norteado pelo § 1.º do art. 128 da Constituição Federal:
“O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução”.
Apesar de a Constituição não mencionar a lista tríplice para o processo de escolha do procurador-geral da República, trata-se de uma tradição implementada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), reconhecida como uma forma mais democrática na escolha dos possíveis indicados, sendo seguida desde 2003.
A eleição para a lista tríplice, em junho deste ano, contou com o voto de 946 membros (82,5%) do MPF, apontando como os mais votados Mario Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Blal Dalloul, respectivamente. No entanto o presidente Jair Bolsonaro ignorou essa tradição de mais de 15 anos, indicando o Subprocurador-Geral da República Augusto Aras para a função.
Onde está o perigo?
Com a indicação de pessoa externa à Lista Tríplice, a JusDh acredita que a indicação por parte da presidência, sem qualquer tipo de participação popular, abre precedentes para o aparelhamento do cargo, permitindo interferências, lobbies e dossiês entre os procuradores.
Em entrevista dada no dia 12 de agosto à Folha de São Paulo, ou seja, antes de sua indicação, o subprocurador-geral Augusto Aras fez acenos ao presidente e teceu tenebrosos elogios ao Governo, além de admitir que montará uma equipe de perfil ideologizado.
A PGR é considerada pelas organizações de promoção e defesa dos direitos humanos como um dos órgão fundamentais para a assegurar os Direitos das minorias. Por exemplo em 2018 a PGR foi fundamental para assegurar a revogação da Portaria nº 1129/2017, do Ministério do Trabalho, que restringiu o conceito de trabalho escravo.
A defesa dos direitos de indígenas e imigrantes também foi objeto da atuação das secretarias vinculadas ao Gabinete da atual procuradora-geral da República. Um do casos foi o envio de reclamação ao STF pedindo a suspensão imediata da sentença que determinou a reintegração de posse da fazenda Nossa Senhora Aparecida, em Caarapó (MS), em desfavor dos indígenas Guarani-Kaiowá.
Em consonância com a perspectiva de Democratização do Sistema de Justiça, a JusDH acredita que atualmente dentre os mecanismos existentes, a lista tríplice é o caminho mais transparente para a nomeação do novo procurador-geral da República. No entanto, pela suma importância do papel do procurador-geral em nossa sociedade é necessário que sejam criados meios mais democráticos para o pleito do cargo, que seja valorizada a voz da sociedade civil.