Soberania popular x coronelismo financeiro

downloadReforma política e a democratização do processo eleitoral são os temas tratados por Jose Antonio Moroni, membro do Inesc e da Plataforma dos Movimentos Sociais da Reforma do Sistema Político, no artigo “Soberania popular x coronelismo financeiro” para a 6ª edição do Caderno Direitos Humanos, Justiça e Participação Social.

Para o autor, atualmente as duas grandes estratégias políticas para mudar o sistema político seriam a iniciativa popular pela reforma política democrática e as eleições limpas, e um plebiscito popular pela convocação de uma assembleia constituinte.

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Confira:

Soberania popular x coronelismo financeiro

Jose Antonio Moroni, membro do Inesc e da Plataforma dos Movimentos Sociais da Reforma do Sistema Político

Muito se fala na reforma política, mesmo que de forma limitada, focando apenas no seu aspecto eleitoral. Nesta lógica não se discute como alicerçar o poder na soberania popular, muito menos como fortalecer mecanismos de deliberação direta pela população e a participação popular, como democratizar a informação e a comunicação, ou democratizar o sistema de justiça (Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Ouvidorias e os aparatos de segurança, especialmente as polícias).

Avançamos pouco na democratização do processo eleitoral. Temos liberdade partidária, que se confunde com promiscuidade na fundação de partidos, com vistas às negociatas do tempo de TV e rádios, e eleições periódicas. Se olharmos, porém, nosso sistema eleitoral, percebemos que o poder emanado desse sistema é hereditário,vitalício, arcaico,   machista, homofóbico e  racista, para sustentar nos espaços de poder uma determinada classe, que  entrega os anéis para não perder os dedos.

São trêsos fatores principais que inviabilizam a democratização do processo eleitoral: o poder econômico, a forma como escolhemos os(as) representantes e o poder da  mídia.

O poder econômico não apenas distorce como também inviabiliza a soberania popular. Basta analisar o financiamento das campanhas eleitorais e a desigualdade abissal entre as candidaturas. Essa desigualdade é o que determina os resultados eleitorais (comcada vez menos  exceções que apenas  confirmam a  regra), comprometendo o caráter democrático das eleições. Nesse sentido, o processo eleitoral reproduz e perpetua a desigualdade presente na sociedade.

Não vamos falar aqui das cifras astronômicas e das formas como agrande maioria dos  partidos arrecada recursos, mas sim  analisar como o financiamento empresarial de campanha é um instrumento poderoso para manter a estrutura  hereditária e classista de poder que temos.

Nas eleições para deputados(as)  de  2010 e  2014, as  candidaturas eleitas, 9,89 % em 2010 e 8,84% em 2014, utilizaram 55,34% e 55,07% dos recursos totais de campanha respectivamente. Emoutras palavras,menos de 10% do total das candidaturas eleitas  consumiram mais da metade de todos os recursos disponíveis.  Em outras palavras, com raras exceções, se elege quem tem muito dinheiro.

Outro elemento essencial da não democratização do processo eleitoral é a forma como elegemos os(as) nossos(as)  representantes para o parlamento.  Temos um sistema de lista aberta, em que ospartidos apresentam suas  candidaturas ( não se sabe ao certo quais os  critérios  usados nessa escolha) e o(a) eleitor(a)  vota num nome.  Parece algo democrático, mas não é, por váriasrazões, uma delas é que as diversas candidaturas não têm as mesmas condições de disputa (cada candidato faz os seus acordos com os financiadores privados e lógico que depois vem a conta). Como cada candidatura busca o seu financiamento, a tendência é que estefinanciamento reproduza os preconceitos e as relações de poder existentes na sociedade, conforme descrevemos acima.  Aí está uma das explicações de por que “se muda” para manter as coisas onde sempre estiveram. Nesse sentido, tirou-se da política o seu poder detransformações e lhe concedeu o poder de conservação, conservar as coisas como sempre foram. Nessa forma de escolha não tem lugar para a representação dos sujeitos sociais e políticos que não estão no centro da engrenagem: mulheres, população negra, povos indígenas, juventude, pessoashomoafetivas, a não ser que pertençam às famílias e grupos que sempre  estiveram no poder. Com raríssimas e cada vez menos exceções.

Para radicalizar essas mazelas, surgem as propostas do distritão, dodistrital puro, do  distrital misto. Piadas de mau gosto que beiram ao deboche, bastaver o que acontece nos países que implementaram. Por exemplo, distritão existe em dois países:Afeganistão e  Jordânia.

Para essa engrenagem funcionar por tanto tempo e sem grandes fissuras é necessário que se tenha um aparato que a legitime e mantenha osquestionamentos domesticados.  Quem cumpre esse papel hoje no Brasil é as diferentes mídias, que por sua vez são controladas poroito famílias que se sustentam economicamente graças à publicidade do Estado e dos grupos empresariais que financiam as eleições.

Temos alguma dúvida sobre quem está ganhando esse jogo de tensão entre a soberania popular e o coronelismo financeiro?

Atualmente há duas grandes estratégias políticas para mudar nosso sistema político – elas se complementam, mas apresentam horizontes políticos diferentes. Uma é a “Iniciativa Popular pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas” e a outra é o “Plebiscito Popular pela Convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político”.

A Iniciativa Popular, organizada pela Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, é um instrumento da democracia direta previsto na Constituição, e tem uma série de exigências, como por exemplo, obter cerca de 1,5 milhão de assinaturas e não apresentar propostas de mudança constitucional, entre outras.

A Iniciativa Popular é uma estratégia que se propõe a atuar em um tempo político mais curto, mobilizando a sociedade para forçar o Congresso a aprovar uma reforma política que responda aos anseios da sociedade. Na questão do financiamento de campanhas, propõe mecanismos democráticos proibindo o aporte de recursos por parte das empresas. As eleições passariam a ser financiadas com recursos do orçamento público e de pessoas físicas, contribuindo para democratizar o processo eleitoral, combater a corrupção e limitar e baratear os custos das campanhas. Propõe um sistema de escolha dos(as) representantes em dois turnos. Os partidos elaboram de forma democrática listas partidárias com alternância de sexo e critérios de inclusão dos demais segmentos sub-representados. O primeiro turno visa definir quantas cadeiras no parlamento o partido vai ter. No segundo turno participa o dobro de candidatos e o(a) eleitor(a) vota no nome de seu representante. Para fortalecer a democracia direta, a iniciativa popular propõe que determinados temas só possam ser decididos por plebiscitos e referendos, como no caso de projetos com grandes impactos socioambientais, privatizações, concessões de bens públicos e megaeventos com recursos públicos, entre outros. Conheça a íntegra da proposta da Iniciativa Popular em www.reformapoliticademocratica.com.br.

Já o Plebiscito Popular abarca três estratégias: trabalho de base, formação política e discussão ampla com a sociedade. Busca-se debater a institucionalidade que temos e a que queremos (sistema político). O lócus político para se fazer esse debate é a convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana. Nesse sentido, o horizonte político do plebiscito popular é de longo prazo, para acumular forças na sociedade para poder provocar as rupturas que precisamos. Para ter acesso ao debate do plebiscito, ver http://plebiscitoconstituinte.org.br/

Não vemos contradição entre as duas estratégias. Ambas procuram criar novas institucionalidades capazes de provocar as transformações estruturais que tanto precisamos. Ambas procuram mudar o resultado do jogo. Que ganhe a SOBERANIA POPULAR.

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